Essas lendas e suas variantes eram o material para um Live Action One Shot de Crônicas de Avalon: Beltain do Bosque Azul 522 D.C que, pelo visto, não acontecerá. Mas o texto ficou tão legal que não merece ficar na gaveta.
Lendas sobre a origem do Bosque Azul:
"Bosque Azul: Um bosque se destaca dos muitos outros do sul do país, onde as árvores cobrem a luz do sol e das estrelas, deixando apenas uma tênue iluminação azulada preencher o espaço entre os troncos. Este é considerado um lugar sagrado para ambos druidas e cristãos, um território neutro respeitado pelos dois grupos."
Crônicas de Avalon vol II: A Velha Britânia, Capitulo I: Geografia, Estregales, Importantes Pontos Geográficos : Bosque Azul (pág. 17). Pedro Borges
Antigas tradições folclóricas da Velha Britânia dizem que o Bosque Azul é o local onde as fadas galesas britânicas, as Tylwyth Teg ( filhas do deus da caça Gwyn ap Nudd ou do deus do Sol e da luz Belenos, nasceram ou apareceram pela primeira vez no mundo dos humanos. Vindas do mundo dos sonhos através de um portal que estaria escondida em uma pedra bem no meio desse bosque. Essas tradições cultuam uma grande pedra com um buraco no meio que fica no exatamente no centro deste santuário. Algumas dessas fadas teriam mais tarde voltado para lá e se tornado seres-arvores, chamadas de Entes adormecidos do Bosque Azul, em um profundo sonhar em um mundo harmonioso, bom e justo neste pais das Ilhas Britânicas. A real grandeza dessas histórias se perdeu no tempo e muito de seu teor simbólico foi esquecido pelos bardos e membros dos Cultos Antigos.
Conta uma lenda mais minuciosa que, na verdade, o bosque foi abençoado pela deusa da cura Grannos, a pedido do semideus Beli Mawr. Portanto, o bosque seria um santuário onde todas as rixas e todos os conflitos seriam resolvidos e inimizades e ressentimentos seriam curados. Inclusive o portal para o mundo feérico, de onde teriam vindo as Tylwyth Teg, seria a ligação regenerada dos dois mundos, material e onírico, lembrando o tempo em que eles seriam um só, separados pelo o grande pai dos deuses Sucelllos. Uma variação dessa lenda diz que na verdade foi a deusa das plantas Don, e não Grannos, quem de fato abençoou o bosque e é por isso que suas arvores protegem quem está do lado de dentro do que quer que aconteça lá fora. Ou ainda, que ambas teriam abençoado o local a pedido da grande mãe Modron, triste com a separação dos mundos imposta pela violência de seu finado marido, Sucellos. Enquanto o Arquidruida Agramyr (um dos maiores representantes da vertente Culto dos Dozes da antiga religião) discute com outros druidas quem é a verdadeira matrona celestial do Bosque Azul, aparentemente para a misteriosa matriarca do local, integrante do Culto à Deusa, tanto faz qual filha, mãe, dama, virgem, nome, avatar, arquétipo, ou face da Grande Deusa deixou seu toque pacífico, feminino e materno no santuário. Já os cultistas mais moderados argumentam que talvez o Bosque Azul seja a prova que os deuses chegaram a um algum acordo, pelo menos uma vez, em toda existência, e todos o abençoaram mutuamente. Mas essa idéia é amplamente descartada pela maioria dos crentes na fé antiga.
Uma lenda diferente, mais comum entre os supersticiosos camponeses que residem próximo ao bosque, ligados ainda aos Cultos Antigos, falam da ligação de outra ser fantástico com o bosque que não as fadas semi-deusas.O Grande Verme Rubro de Annwn ou, como é mais conhecido, o Dragão Vermelho de Estregales, o mesmo que teria enlouquecido o Rei Pellinore e que assombra a região pantanosa do país, seria o ultimo de sua espécie monstruosa. Praticamente fadado a extinção, esta criatura aterrorizante, para se proteger da ganância e crueldade dos humanos, escondeu seu próprio coração azul, cheio de bondade, enterrando-o no solo do bosque. Seria por isso que esta besta possui no buraco de seu peito apenas maldade e crueza. Também é dito que as raízes das arvores do bosque se infincaram profundamente no órgão auto-extraído da grande fera, refúgio de sua bondade perdida. Seria por isso que as arvores de lá passaram a exalam o amor e benevolência esquecidos que o Verme de Annwn. Dentro dessa crença, alguns poucos membros dos Cultos Sangrentos, a vertente mais bestial da fé pagã, mais especialmente os fanáticos bárbaros da tribo conhecida como Filhos (ou Servos) de Annwn das Montanhas Altas, sugerem que seja necessário fazer anualmente uma prática um tanto bizarra: Um coração de uma pessoa bondosa deve ser extraído ritualisticamente em sacrifício ao verme nos Pântanos do Dragão no solstício de inverno, transportado para o bosque e enterrado á meia noite da próxima lua nova em baixo para alimentar a bondade do local e assim evitar a ira do monstro sem coração. Quase todos outros devotos dos Cultos Antigos discordam dessa idéia dos Filhos, achando que tal sacrifício só alimentaria o buraco de maldade do dragão e o corpo-sombra do ser sacrificado ficaria vagando pelos arbustos e árvores do bosque para todo sempre. Todos, entretanto, concordam que, no caso desse monstro realmente existir, o bosque teria alguma espécie de influencia sobre ele. Segundo os relatos daqueles que sonham e até já o viram, ele evitaria a região sul de Estregales, onde está este santuário, ao voar de seu refugio nas montanhas para dentro de seus pântanos e assim de volta sucessivamente. E ainda mais, talvez esteja realmente escondida no interior do santuário a única a solução para se lidar a besta de uma vez por todas (ou então, numa visão bem mais cética, para se livrar do fanatismo sanguinolento dos bárbaros Servos de Annwm e seus sacrifícios humanos). Especula-se, dentro desse ponto de vista, se a grande pedra (o suposto portal das Tylwyth Teg) seria o esconderijo do coração petrificado desse ser fantástico. Ou pior ainda, seria o próprio coração petrificado, e o buraco seria uma peça de encaixe no corpo do monstro. Se isso for verdade, cultuar a pedra poderia estar aumentando o poder da fera, ou pior ainda, a ausência de um culto constante ao órgão extraído poderia vir a enfraquecer gradualmente a magia do santuário. Mais um motivo para se temer os sacrifícios exigidos pelo druida "Boca de Annwn" da Tribo dos Filhos do Verme.
Já as lendas tardias cristãs tentam associar o Bosque Azul como sendo o local onde José de Arimatéia teve um presságio divino. Em suas andanças e peregrinações pela Britânia, exausto e amedrontado com os demônios pagãos que assombravam sua viagem, o santo teria tido uma visão da Virgem Maria, enquanto descansava e rezava, protegido pelas árvores do santuário. O local então seria um refugio natural da Fé Verdadeira, ponto de partida entre o diálogo desta com os equivocados pagãos, que cultuam a legião de Satã disfarçada de deuses britânicos. Alguns cristãos celtas, que aceitam os deuses antigos como máscaras da Santíssima Trindade, afirmam que este mesmo José, antes de fundar a primeira igreja na Cornualha, teria evangelizado uma pequena tribo de selvagens, com pinturas azuis nas suas faces e corpos, que viviam no interior do bosque, que na época era um descampado. Mais tarde, estes selvagens catequizados, ao serem enterrados ao modo cristão, tornaram-se as próprias arvores protetoras do local, como que por milagre divino. Essas árvores assim protegeriam tanto os pagãos quanto os cristãos, tanto por herança quanto por devoção, aguardando a vinda do Messias no Juízo Final para voltarem a andar novamente, agora como Entes do Senhor. Dentro dessa visão, a grande pedra perde sua importância pagã ou mesmo ganha um status cristão, passando a ser o altar onde o peregrino cristão teria batizado e convertido os selvagens.
Conta ainda uma tradição iniciática recente de Avalon, cheia de significados místicos intricados, que a avó de Viviane encontrou aqui um nobre cavaleiro cristão (presumivelmente o próprio José de Arimatéia, visto que a antiga fé não nega a existência da nova, ao contrario do que fazem a maioria dos cristãos). Ambos se teriam se apaixonado e se amado loucamente, sob a proteção do bosque, durante todo um ciclo lunar. Somente após abandonarem o local, retornando para seus séquitos, teriam se desentendido seriamente, terminado assim suas relações amorosas. Este seria o real motivo, segundo essa tradição, da rixa entre os Cultos Antigos e a Santa Igreja. Qual o significado dessa paixão arrebatadora e lasciva? Porque um ciclo lunar inteiro de amor? Qual o verdadeiro desentendimento teria causado o rompimento entre a então Dama do Lago e o Peregrino Cristão? Só os iniciados da Ilha de Avalon saberiam a resposta. De qualquer forma, o miasma criado pelo incessante amor entre pagão e cristão teria inundado a terra do Bosque Azul e este seria o motivo de seu território neutro, fértil e fecundo. Variações dessa tradição, passada pelos antigos devotos do paganismo agora convertidos ao cristianismo celta, dizem que o Cavaleiro em questão seria realmente José de Arimatéia. Este teria caído em tentação ao se deitar com uma bruxa pagã que o teria seduzido com suas artimanhas e feitiços diabólicos. Ao perceber o que fizera, teria se arrependido, interrompendo o coito com a prostituta do demônio, fugindo apavorado e nu para Cornualha, onde fundaria sua igreja como prova de sua vergonha. Talvez, segundo estes, o bosque teria então em sua terra seu solo a semente de José, que ele não teria deixado dentro do útero da concubina de Lúcifer, mas esparramado pelo solo durante sua fuga. A resposta dos sacerdotes de Avalon para essa corruptela de sua lenda afirma que a então futura Matriarca da ilha não quis se subjugar aos conceitos machistas, intolerantes e desiguais do santo cristão (nem nos ideais e nem no leito de amor) e ela sim foi embora do bosque, abandonando com o coração partido para de volta para Ynis Wydryn após satisfazer seu desejo pelo forasteiro. E assim, teria escorrido de suas pernas nuas, enquanto partia, a mistura de sua fecundidade com a do santo, se esparramando no chão, adubando o solo das árvores com amor e fé de ambos Cultos e Igreja. Outras sacerdotisas, essas um pouco mais sarcásticas, dizem que, na verdade, o cristão teria perdido sua potencia sexual ao final do ciclo lunar e por isso sim fugido de vergonha deixando Viviane frustrada. De qualquer forma, com o efeito, a grande pedra apenas simbolizaria o local onde se deitaram macho e fêmea, e o buraco no centro apenas serviria para lembrar a falta desta união carnal e amorosa entre os representantes de ambas as religiões da Velha Britânia.
Numa versão bem diferente dessa historia, contada pelos seguidores de Morgana e pelos poucos peregrinos e viajantes que passaram pela sua Torre Solitária, revelaria que o lendário Arquidruida Balise, poderoso tutor do próprio Merlim, teria raptado a irmã de José de Arimatéia dos braços do próprio marido cristão para tomá-la como escrava-amante. Para se esconder dos estrangeiros seguidores do Cristo, o hábil raptor teria sacrificado uma das raríssimas pedras mágicas (especificamente de magias de proteção e ocultamento), espalhando seus pedaços por todo o bosque. Uma variação dessa lenda ainda diz que a pedra despedaçada era, na verdade, ainda mais rara: Seria uma das pedras de magia de amor, para assim poder aproveitar bastante suas núpcias com sua amante cativa. Como quem conta um conto e aumenta um ponto, já se especula que teriam sido os dois tipos de objetos mágicos sacrificados pelo lascivo feiticeiro em nome de seu desejo. De qualquer maneira esta história ainda diz que José e seu cunhado, para salvar a irmã raptada, guiados por um espírito-protetor que os cristãos chamam de Anjo, espalharam também pelo bosque alguns pedaços desfiados da própria mortalha de Jesus, que o santo traria sempre consigo de Jerusalém, no intuito de protegê-la das magias amorosas do mítico Arquidruida. Por fim, uma ultima variante, bem mais recentemente, surgida junto com o inicio da Demanda do Santo Graal, conta que na verdade o santo de Arimatéia e seu cunhado teriam na verdade derramado quatro gotas do conteúdo do Cálice Sagrado nos portais dos elementos nos quatro cantos ou direções do Bosque Azul, (Norte - Ar, Sul - Água, Leste - Terra e Oeste - Fogo). Fazendo isso estaraiam santificando o local para tentar imunizar as bruxarias luxuriosas de Balise. Uma grande lasca da pedra mágica do druida, um grande pedaço da mortalha do Messias Crucificado ou ainda uma quinta gota do Cálice poderia ter sido derramada no buraco da pedra sagrada do santuário. Ou ainda, num exagero, todas essas coisas juntas.
Independente de sua origem factual existe, escondida em todas essas histórias, lendas e suas variantes, uma tentativa real de se explicar não só a proteção divina do bosque, mas principalmente a tentativa de dar um porquê do local ser igualmente sagrado para ambas grandes devoções da Velha Britânia. Mais ainda: porque lá, aparentemente, tanto os feitiços e magias pagãs quanto a fé verdadeira e ritos dos cristãos são igual e poderosamente beneficiadas. Oráculos e Santos de grande sabedoria concordam em apenas um aspecto: Lá, a força criativa do mundo se protege da entropia que a tudo quer findar, enquanto que, fora deste santuário, a realidade se torna cada vez mais escassa, banal, cética, cínica e moribunda.
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